Sejam bem-vindos ao outro lado do espelho, onde tudo pode acontecer (e acontece).

Wonderlando é um blog sobre textos diversos, descobrimentos e crescimento. A filosofia gira em torno do acaso, misturando fantasia e realidade de dois amigos que se conheceram também por acaso, Alice - que tem um país só seu -, e Yuri - chapeleiro e maluco nas horas vagas.

Leia, comente e volte sempre... Ou faça como a gente e não saia nunca mais.

31 de dezembro de 2009

Nem título eu sei dar pra dizer sobre 2009

do começo ao fim
neste ano, abandonos.
neste que passou, passe por favor.
o amor é um bônus
mas e toda dor?
na verdade nenhum ano tem fim

aprendi que quem abraça esfaqueia
quem faz amar,
também faz sentir o ódio nos ossos
E a raiva na veia.


- - -
O que você disse sobre meu post, Lice, tem razão. Mas não seguirei e vai isso mesmo. Esse ano não foi perdido, foi horrível, desequilibrado. Foi maravilhoso e um pesadelo - tudo ao mesmo tempo. Não arrisco escrever sobre ele, recuo, não me atrevo, acovardo. E ano que vem, aquele nossa esquema de texto que não vamos divulgar aqui por enquanto, claro! hahaha

Não tenho resoluções nem esperança de nada, voltou a descrença e a falta de tesão em tudo. Então só que 2010 venha melhor, por favór (acentuei só pra rimar - e firmar!).

Meio estranho/falso/verdadeiro

Se a vida seguisse a matemática, tudo seria muito mais fácil. E este final de ano não seria um caos como parece agora. Pois nos últimos anos, final de ano ímpar era bom e final de ano par era ruim. Por este desânimo, desculpem-me o texto cru e sincero.

O pior é que, quando percebi essa falsa regra, as coisas caminhavam para um bom final de ano. Mesmo com o fim terrível e dolorido, eu me sentia feliz, encantada e empolgada como há muito tempo não estava. Mas as coisas logo mudaram e ficaram turvas. Então, eu aprendi que gosto de viver e que tudo bem as coisas mudarem de repente, porque é vida e acaba sendo divertido. Meio estranho, meio falso, meio verdadeiro.

Eu ia me deixar contaminar por este conturbado fim de ano, mas hoje acordei bem. Então, vou refletir. Comecei esse ano num cruzeiro. Eu morro de medo de navios. Mas foi uma experiência formidável. Então, retornei disposta a lutar pelo meu castelo que estava em ruínas. Investi muito nele, muito mesmo. Mas não consegui que ele voltasse a ser o que era e, agora, ele foi desfeito. É muito triste tudo isso, ainda não sei lidar muito bem, estou meio perdida. Sinto saudades, mas também acredito que fiz o meu melhor.

Além disso, este ano encarei pela quarta vez meu maior fracasso e fracassei de novo. Acho que tem certas coisas que a gente simplesmente tem que aceitar. Mas me senti abandonada por que eu mais esperava ajuda e foi aí que tudo veio abaixo.

Na faculdade, porém, fui mais feliz. Encontrei mais amigos, mais apoio e mais discussões com professores bitolados. Descobri potencialidades em mim, o que me deu esperanças.

Gostaria de agradecer meus amigos pelo apoio que me deram quando eu mais precisei. Ajudaram-me nas mais diferentes formas, o que facilitou muito as coisas para mim.

Para 2010... bem, penso em pedir paciência de novo. E calma. Na verdade, agora, eu quero paz e tranqüilidade. Quero ser feliz, sem ter que pensar muito para isso.

JUNKY'S CHRISTMAS

este texto não significa nada. ele significa tudo. este texto, eu demorei tanto pra escrever porque não consigo me recuperar. e acho que quero, dessa vez eu quero. meu natal, divirtam-se:


(close na TV e vai dando zoom out abrindo o plano pra sala. Depois disso deixa rolar a fita, não para hein!) A TV ligada no velho Burroughs com seu sotaque texano detestável. Bem baixinho, só para me acordar. Chia em meu ouvido me fazendo abrir os olhos e perceber que minha cama é feita de vômito. Cheiro o azedo do ar e gorfo. Sinto meus dentes mais sensíveis, minha boca seca, olho minhas mãos. Um pouco de sangue, um pouco de náusea... Que noite. Alguém arrancou a seringa do meu pé, sempre infecciona porque eu sempre esqueço, por isso nem me pico mais no braço. Saí dessa vida, saí dessas loucuras que eu sinto falta às vezes por ser tão autodestrutivo. Voltei porque fui obrigado, porque era isso ou a Morte. Eu queria os dois. (fecha na carta do ceifador no tarô e numa seringa cheia ou vazia, ainda não sei).

Eu rasgo essa pele na esperança de vazar pra fora dela. (produzir cenas de cortes e sangue).

Acordou (abra los ojos, cena de olhos se abrindo e borboletas abrindo as asas). Não dormimos juntos, mas estava ao meu lado, com o cabelo ensebado e os olhos manchados de maquiagem preta. Bom dia. Bom dia. Que dia é hoje, que horas são? Me beijou o rosto e abraçou minha carcaça pálida e ferida, encostando seu corpo quentinho em minhas dores. Agradeceu por estar viva. Agradeceu a mim, na verdade por eu fazê-la se sentir viva. Acabo sendo o salva-vidas. Mas Ela não corria riscos ali. Eu risco.

Foi tudo mentira. Agora me lembro. Acordei e não sabia quem eu era. A sensação de acordar, para mim, é como vir nadando ofegante lá do fundo do mar e poder respirar de novo, só que, na verdade, o anseio é para continuar no fundo. Assustado como sempre acordo, onde estou, que horas são? (relógios, barulho de relógios)Rodeado de pessoas desconhecidas, barulho, aquele cheiro horrível de... de... é familiar, mas desmaio antes de saber. (barulho de eletrocardiograma e coração. Fade out). (sem imagem)Acordei cheio de vômito seco, um odor azedo e uma agulha em meu braço. Outra vez? Não, dessa vez era soro. Não era mentira.

(Kiddo em preto e branco sentado numa pilha de corpos no meio de uma fábrica - trilha)Drogado, ninguém liga pra você, ninguém se importa com você, o melhor a fazer é morrer feito peixe fora d'água, se debatendo sem ar na calçada do hospital. Você, nós, somos o lixo social. O trabalhador é o lixo social, todos somos merda para o Estado. Então FODA-SE, prefiro morrer agonizando numa sarjeta qualquer do que suando a carcaça velha e magra trabalhando doze por sete para um patrão que não dá a mínima pra você, pra sustentar um monte de filho pra eles terem um futuro melhor. HA-HÁ, “um futuro melhor”. (Há tempos quero destruir o Estado).

Overdose. Quem diria, nunca havia tido uma, confesso que me assustei. Na hora eu sabia que ia acontecer, mas eu não conseguia parar, simplesmente.

Não há limite para minha dor.

Manhã cedo de natal. (close na roda da frente girando, depois corta prum plano aberto) Eu estava na moto, louco de tudo, sem capacete com a barba e os cabelos se enroscando com o ar, indo para lugar nenhum, vestido com uma camiseta suja e amarela com a cara do Bob Esponja e uma cueca samba-canção creme com folhas de maconha verde desenhada, descalço com o pé inflamado. A garota agradecida estava na garupa, em pé, apoiada no pézinho da garupa, com um vestido verde cor de grama até um pouco acima dos joelhos, descalça, com os cabelos ralos soltos ao vento e um sorriso de boca fechada muito sincero (roda a câmera em vários ângulos). Ela é muito sincera comigo. Tem a pele tão branca e é tão delicada que deve ser lindo vê-la voar (close de baixo pra cima, pés a cabeça). Eu queria voar. (voo)

Depois de quase cairmos e batermos em tudo a nossa frente, paramos num lugar alto, não muito longe, mas calmo, onde desse para ver as coisas e pensar nelas. Eu nem sabia onde estava, mas nunca sei. Por um breve momento a sobriedade bateu e me pegou desprevenido. Chorei por sentir as dores do meu coração de vidro quebrado espetando tudo dentro do peito. (Meio plano) Descambei o choro, comecei a me bater, chutei a moto. Eu queria por fogo em tudo e me jogar dentro da chama. Ela tentava me segurar, mas eu não conseguia parar. Eu não conseguia parar com as drogas, com a violência, com o sofrimento. Não conseguia parar de pensar. Ela chorou junto e terminamos sentados e abraçados, não conversamos. (fade out). Voltamos pra casa.

(câmera passeia pelo ambiente) Corpos caídos por todo lugar. Quando se está sóbrio aquilo tudo parece ruim. (planos curtos, cortes secos) Roupas jogadas e sujas, vômitos, mijos, sangues, bebidas, colheres, isqueiros, cigarros, vidro, o fedor disso tudo. O som ainda rolava, mas não sabia o que era, parecia Comin’ Back To Me, do Jefferson Airplane – acabou comigo e tive que correr pro banheiro pra ver o quanto mais agüentava chorar.

As pessoas ainda conversavam, eu ainda vivia. Esses grupos junkies mudam muito, isso é que é ruim, eu já não conhecia quase ninguém, e é sempre “o mesmo grupo”. Uns morrem, outros são internados, uns enlouquecem, outros fogem porque estão devendo para alguém. Todo mundo, no geral, está sempre devendo. Mas tem aqueles que não saem do lugar, que não morrem, que não melhoram, que não enlouquecem, que não se internam, que não fogem. Que não.

O mesmo Burroughs na TV. Na noite de véspera de natal (a noite anterior, repassa todo o filme em fastforward) festejamos nossas angústias e dores de mais um ano, a ceia foi preparada com muito carinho (plano de cima): uma mesa pequena, quadrada, azul, cheia de pó, pedra, M, maconha, sintéticos, lisérgicos e improvisados à volonté (cena em PB de um francês de calça preta, camisa listrada, boina, bigode fino e cigarro repetindo à volonté). Para junkies depressivos, nóias e acelerados, todos os gostos. Tinha pai de família, homem de terno, advogada, skatista, vagabundo, hippie, punk, gente normal. Ao ataque no sinal do Anfitrião - que sabe que tem o poder nas mãos e gosta disso - discursa: “Caros amigos, colegas, desconhecidos, é com muito prazer que proporciono este maravilhoso encontro natalino e (bláblábláblá). Sintam-se à vontade” - Mãos por toda a mesa. Conheço o Anfitrião há algum tempo, ele adora ser educado, mas é perceptível seu esforço para sê-lo.

O que eu gosto daqui é que todos têm apelido. Foi aqui que, anos atrás, ganhei o meu... Kiddo. E a agradecida ganhou o dela dessa vez: San, de sã, sóbria – é assim que chamamos quem só altera com álcool. Além do resto do pessoal, Anfitrião (auto-explicativo), Agulha (enfia até água na veia se deixar, mas ninguém deixa... faz mal), Doze (nariz de doze, cheira fundo), Taz (era tamanduá, mas era difícil, daí virou Tam e virou Taz – até porque ele fica tão louco quanto o Tazmania), e por aí vai. Legal né? Mais legal ainda foi depois da ceia. Pink Floyd, Velvet, Doors, Hendrix... Me senti em Woodstock. Mas aqui não era meu lugar, essa gente é lixo, é talento desperdiçado, é escrava do vício, não é isso que queria pra mim, por isso saí. Por isso lutei muito e saí. E neste infeliz natal, pela primeira vez na vida, fiquei tão perdido e fraco que não sabia o que fazer, com quem conversar, aonde ir. Vim parar aqui. Um amigo disse recentemente que só caminhamos em círculos (!); que o que fazemos hoje é atirar um bumerangue (cena do bumerangue voando em câmera lenta), e que quando ele volta, volta mais pesado, mais carregado direto na tua cabeça. Isso fez muito sentido pra mim,

[deletei]. (cena de uma mão teclando o delete).

(A cada "quero esquecer", ele se dá um tiro na cabeça - meio plano pra essa cena... hmm... acho que quero em PB também )Quero esquecer tudo que aconteceu, esquecer que existe esse lugar que me atrai como um ímã, esquecer a vida, este fim de ano de merda, esquecer que existe o amor... E carregar a minha dor até virar cinzas. (Cinzas voando).

Fin.


Junky Christmas. Era isso ou cear miojo em casa.

24 de dezembro de 2009

.final ()

Ponto final.

Começo no fim de mais uma decepção. Mais uma glória rasgada, e mais lágrimas desperdiçadas. O último. Sete significa sorte para alguns... Hahaha, até esqueci aonde ia chegar. Mas é o último. Dramático e perdoável como todos foram, o último.

O natal (assim com letras miúdas mesmo) passou quase despercebido. Teve que pendurar um colar de luzes e um sino dourado como pingente no pescoço do papai noel (assim com letras miúdas mesmo), tunar seu trenó e colocar mais 200rp - renas de potência; e o nariz do Rudolf agora é de xenon. E mesmo assim, eu não o vi.

O espírito de natal estava enrolado num carteado com o diabo, se atrasou todo e esqueceu de alguns lugares. E assim ele embolou com todo o fim de ano. Todos os planos, todas alegrias... As férias viraram castigo. Meu pai (que não é noel) desapareceu. Colocou tudo em seu saco e desapareceu. Levou o sorriso de minha mãe, as lembranças, o amor, e os DVDs (que até agora eu não me conformo). Ora, por que os DVDs? Aposto que ele também é o culpado por estes dias de sol escaldante.

Estávamos infelizes. Mas infelizes como sempre. Agora a tristeza é outra. Não é só minha, e isso é insuportável. Somos todos corpos escorregadios nos esquivando de abraços e carinhos. A atenção vem nas piores formas. Gritos e choros e velas derretidas. Nem a fé é sólida. E cá estamos esperando e tentando um ano novo (assim com letras miúdas mesmo) melhor, um ano novo mais digno e decente. Um ano novo fora daqui.

Não sei o motivo de eu escrever isso agora, eu tinha até outra coisa em mente. Mas essas semanas, o assunto não foi outro. Na televisão só se fala disso, nos jornais, nos amigos e parentes, nos filmes... É só isso.

Eu sinto raiva de todo ano que acaba porque ele nunca acaba bem. E sinto raiva porque se eu o aproveitei bastante, não deveria ter acabado.

Não sei como terminar esse texto, assim como não sei como terminar este ano; assim como não sei como terminar nada na minha vida. Mas ele sabe. E terminou.

Postado no extinto Susi Não Anda Sozinha no final de 2007. Eu continuo sem saber...

22 de dezembro de 2009

Sal

Lágrimas de algo perdido, algo inesperado. Lágrimas de toda hora, toda dor e sofrimento. Lágrimas que simplesmente acontecem, de repente e mais forte do que eu. O que eu sinto é mais forte do que eu. E eu sinto falta do seu sorriso. Luzes coloridas não trazem minha alegria de volta. Sinto o brilho da Lua na minha nuca. E não consigo parar de chorar. Sou um líder derrotado. Ela não consegue me acalmar, me vê doente. Ela é a doença e não consegue parar de chorar. O amor é a maior experiência nessa vida.



[posfácio]
amor.


O cenário é a cidade inteira. Meia luz da Lua, luz e meia das ruas. Ela se via refletida em outros olhos. Não há mais ninguém nesse mundo, só ela e o dono do olhar. Na mesma hora, sem saber de nada mas sentindo tudo, eu fui dormir só para me afogar no ar. E morrer.

Eu não consigo parar de chorar, então paro por aqui de escrever.

Traição

O que é esse pesar tão grande
Que nunca havia sentido
Mesmo em passos errantes
Mesmo gritante no ouvido
Nunca me importei
Nunca havia conhecido
Porque não quero saber se errei
Se estava presente ou havia sumido
Minha confiança sempre foi maior
Em mim e em meus amores proibidos
Até você provar que o amor é vidro
E cortar em seus lábios meu coração
Brechas no caminho são –

Faz engasgar, a traição
Embaça a vista
Ser nada mais que placebo
Ata-me e mate-me, prefiro
Como frágeis somos, agora percebo
Dói como um tiro
Pelas costas, na arma, o amor
Que sangra sem morrer
Um sangue de dor
E um último sorriso
Olho pra trás,
Traidor

27.11.2009

19 de dezembro de 2009

Porque é triste o fim

Os desencontros são os piores encontros que se pode ter. Não me refiro ao encontro no qual uma das partes não aparece, digo o encontro no qual ambas as partes estão presentes não no mesmo presente: desencontro. Vamos marcar um desencontro? Vou de ontem e você de hoje. Não, vou de futuro e você de arrependimento.

Somente nos encontramos em desencontros. Parece-me agora que ficamos tão pouco tempo no mesmo lugar. Na verdade, todos os encontros que tínhamos foram contados. Um, dois, três e o quarto durou horas e horas... dias, meses. Um ano, eu diria. E, então, nos desencontramos. E tudo começou há exatamente um ano. Época terrível, que nem foi eternizada em meus escritos diários, somente em nossas memórias, na esperança de que um dia falhassem. Desde então, tivemos desencontros.

Acho que combinamos lugares diferentes para nos encontrar. E, apesar da briga e do aparente acordo sobre o local de encontro, estávamos em dimensões paralelas. Eu vivia num apaixonamento humilhante e você numa frieza patética. Até que nos encontramos nos desejos de passado... sede da volta aos encontros de dezembro.

É triste ver o fim da nossa história nos desencontros descontrolados ao telefone. Perdemos nossos papéis e não sabemos o que fazer um com o outro. Bem, você eu tenho guardado na minha caixinha. Quando te quero, eu a abro e dou uma espiada para encontrar seu cheiro e desencontrar o presente.

Mar Morno

Uma tesoura grande e pontuda encontrou meu corpo. Terminou em meus pálidos punhos vestindo-me de sangue. Minha veia azul chorava e umedecia a camisa escura de manga comprida. Sentei acuado, repousando meu corpo de guerra vencido, sentindo a desistência e covardia causando mais remorso. É um labirinto sem saída, minha vida. Fugir é covardia, ficar não faz sentido. E tudo causa um remorso e uma culpa incurável.

Comecei sabendo onde estava pisando, mas qualquer coisa seria mais firme que meus passos naquele momento. Foi o que me salvou de tantas coisas e me fodeu em outras. Se eu pudesse voltar atrás, faria tudo outra vez, eu não tinha opção. Deixo para agonizar quando ninguém está vendo. Não divido com ninguém minhas intermitências venenosas mais sérias. Durmo o sono dos condenados quando já é cedo. E a insônia me tira dos sonhos mais quentes. Para mim é sempre tarde porque estou sempre atrasado nesse lance de viver, ainda não me acostumei com a ideia.


Bate primeiro na parte de trás das pernas, depois atrás do pescoço, espalhando uma onda de relaxamento que descola a pele dos ossos, de modo que sinto flutuar sem gravidade num mar morno. Chove quente em mim, e tranquilidade igual a essa só no ventre de minha mãe. Se não fosse a perturbação de sentir a presença de alguém que não está presente. Uma sombra no canto da visão que desaparece toda vez que corro os olhos para ver. Move-se quando eu mexo a cabeça, então nunca a vejo. Causa medo, talvez seja a solução.


Vi a medida da vida em gotas. Experimentei a agonizante privação da doença da droga, e também o prazer do alívio, quando as células sedentas beberam da agulha. Talvez seja só isso e nada de mais. Talvez todo prazer seja alívio. Então chorava mar morno de lágrimas psicodélicas e fermentava meu alimento na colher queimada. Eu não queria, mas me salva. E pelo desespero, ando fazendo qualquer coisa para ser salvo, para tapar os buracos de meus defeitos, medos e inseguranças. Tentando me convencer de que eu sei o que estou fazendo, ou que viver vale a pena.


[EVO] Cidade

A cidade é um labirinto, um monstro faminto de garras sombrias. As ruas são caminhos para todos os lugares e para nenhum deles. Ruas próximas, distantes, frias. Tudo assim ao mesmo tempo, com a mesma veracidade. Visceral. Ando por terra, por baixo dela, no busão, coletivo-condução. Me leva sem destino porque não tenho onde ir. Se não posso lutar, estendo o braço pro primeiro que passar. Posso fugir. Giro, viro, rodopio… Acabo no mesmo lugar.

Em pé ou sentado, vazio ou abarrotado, me leva e me deixo levar – mas R$ 2,50, o que é que há? – É pela sua janela que me vejo refletido no cinza que passa e ainda é cinza, por onde meu olho enxergar, cinza de poluição, até o som. Cidade de tons. Funk, choro, histórias pela metade – às vezes até fazemos parte, quando aquele velhinho simpático e solitário faz companhia a este jovenzinho antipático e solitário. Ele com a vantagem da simpatia e experiência, eu com a vantagem do tempo que me resta. Ou não, bato a testa no vidro, dormi sem querer. Perdi o ponto, o equilíbrio, o conto. Puta que pariu, tô fudido.

Andando parado, às vezes sem itinerário, é onde li grandes autores. Nos transportes mais lotados foi onde conheci grandes amores. Passageiros. Coletivo de gente. Cada um, um diferente. Cada um uma Torre de Babel. Aqui sim eu acredito, não naquela do livro tão bendito. No céu, nem sinal do Sol. Dou o sinal, me despeço de todas as etnias, credos, cheiros. Busão barulhento. Tudo no mesmo lugar, ao mesmo tempo. Um lugar móvel que conta histórias, guarda lembrança, mas não deixa saudade. Todo coletivo é uma cidade.






Texto publicado no Eu Vou de Ônibus. Toda segunda, quarta e sexta-feira (meu dia) tem texto novo. E quem tiver alguma história ou conto sobre coletivo também pode participar, é só entrar lá.

16 de dezembro de 2009

[foto-documentário] Kinetic

Foto-documentário sobre movimento, elementos e energia. Eu e a Lígia Ruy também fizemos em forma de revista impressa - que não estará disponível e que ficou muuuuito mais legal!



11 de dezembro de 2009

[curta-metragem] 70 de Novo

Primeiro e único filme de uma produtora que não rolou.





não usem drogas, crianças.

[curta-metragem] Ao Cubo

Curta metragem que fiz com um pessoal da Metodista pra um concurso de curtas de 1 minuto patrocinado pela Sony.

"Ao Cubo" from Curta 1 Minuto on Vimeo.



Não, não ganhamos. ¬¬

[documentário] Despertar

Documentário que deu trabalho porque é acadêmico.

Nota

Olá queridos leitores (crii-crii-crii).

Enfim, esse semestre foi um semestre de produção. Estive um pouco ausente aqui do nosso querido Wonder por esse motivo, principalmente. Dois curta-metragens, uma revista radiofônica sobre arte, uma revista e um foto-documentário sobre movimento, uma reportagem especial sobre cinema marginal e um mini-documentário! Além da mais nova empreitada, o Eu Vou de Ônibus - toda sexta-feira tem texto meu lá.

Ufa, espero nessas férias que estão por vir poder filmar mais um roteiro pronto já.

Vou postar as produções todas e espero que vocês comentem e sejam críticos.

Valeu ;)

9 de dezembro de 2009

Life in a Glasshouse

Um pequeno som me destrói. É mais um ruído constante, sonante. Segurei meus braços até não senti-los mais e me estapeei como outro alguém. Ecos devolvem minhas palavras distorcidas. Será que é assim que soo?, penso. Não sou levado a sério.

A casa é de vidro e espelhos lisos sem penduricalhos para distrair. E mais uma vez eu estou perdido aqui com meu único amigo. Ele tenta fazer um papel de parede de tom pastel, um marrom apagado que não é bege e é fraco demais para ser marrom. É triste... porque não é nada, combina com a gente. Allan desenha um sorriso na esperança de sorrir. Eu gostaria de estar no papel de parede da casa mais verde para poder enfeitar. Brincar de correr, me esconder e cantar. Mas o conhecimento me destrói. Eu e ele ficamos ali, sentados no chão vazio da casa de vidro. O único cuidado paliativo ali pra ele sou eu – ele pra mim. Esperamos ansiosos pela Morte, ou pelo final de algo que já começou, o fim.

Nos olhamos multiplicados nos reflexos, nus e sem cuidados. Tenho feridas que não se curam porque insisto em arrancar sempre a casquinha. É inconsciente, prazeroso, quando percebo, já foi. Allan mastiga e engole minha pele morta e me devolve seu sangue em troca. Somos nosso próprio alimento, nos consumimos. Em nossa multiplicidade, somos mais, assim como nossos anseios, nossa fome, nosso desejo e desespero. Mas não o desejo mais do que o já tenho. Por ele, digo o mesmo. Claro que eu gostaria de sentar e papear, mas me ouviria e não agüentaria. Desespero.

Um pequeno som me destrói. É mais um ruído constante, sonante. Algo que não consigo controlar. Minhas fraquezas são muito fortes. Ecos devolvem minhas palavras distorcidas e racham as frágeis paredes. Será que é assim que soo? Mais um pouco os cacos se espalham pelo chão, e então mais um estranho erro a cometer. Allan e eu, sozinhos, cada qual em sua solidão. Não nos dizemos, mas ouvimos o pequeno som que nos destrói. Evitamos pela vida. Na casa de vidro. De Espelhos.




*imagem de Adriana Peliano

7 de dezembro de 2009

Melhor regresso

Enquanto nada novo aparece, voltemos a 2007!

outro dia eu acordei
querendo saber como eu estava
quanto mais eu descobria
mais triste eu ficava
se deus existe, quem é ele?
se não existe, quem somos?
o que faremos, o que seremos,
se agora somos, então me diga o que fomos?
quero conhecer mais meu mundo
saber de onde eu vim
às vezes desejo o sono profundo
meu pecado é a ância pelo fim
o ódio cega e me faz perder
a tristeza se materializa, se transforma
cai do meu rosto cria forma
molha o papel e me faz esquecer
da beleza que encontro no céu
que enfeita meus sonhos sem saber
o peso da culpa me impede de olhar
acima dos meus olhos
me impede de voar
não vejo motivo pra nada
tão distante, quero encontrar
o meu lugar

Será que estou sempre errado?
andando sempre na contra-mão?
eu estou vendo olhos negros
quem me mostram solução
se escondem nas minhas sombras
e se perdem na mesma escuridão
não vejo o medo chegar
que por medo, não me encara
não tenho o que perder
porque não vejo motivo pra nada

meu melhor regresso
essa minha inútil deficiência
o auge do meu sucesso
é minha vergonhosa decadência
meu melhor regresso
minha ingênua carência



mas há de chegar
há de chegar pra me salvar
há de chegar pra me levar
me tirar daqui
desse lugar que eu vim parar
onde não há onde se amparar
só cair e cair e cair

30 de novembro de 2009

Descanse em Paz (Killer Cars)

Duas luzes à minha direita. Pisco. Ela está maior, agora é uma só. Gotas de vidro caem do céu e espelho da superfície. Barulho de borracha no asfalto, os freios desistiram. Pisco. Ela vem em meu encontro. Cumpre o prometido e me derruba. Luzes feitas de ferro pesado, motor e poluição. Vejo meu reflexo cada vez mais perto em direção às ruínas. Do chão, outras luzes, dessa vez mais serenas. Olho atentamente como sibilam, elas me olham de volta.

Eu não tive medo, não me assustei. É um perigo para a vida, não temer a Morte. Minha vida não passou diante dos meus olhos, não desta vez. Talvez algo maior em mim soubesse que não ia dessa pra melhor. Não desta vez. Mas por alguns instantes me vi livre das responsabilidades, das dívidas, da faculdade, do trabalho, e de toda gente chata que me rodeia onde quer que eu vá. A desejei. Faça parecer um acidente – sussurrei em seu ouvido, um segredo só de nós dois.

Toda vez será a última. Sinto meu corpo jazer na estrada, descanso no asfalto molhado e quente. Meu leito. Um piscar mais longo, e outro. Até não mais. Aqui quero descansar em paz.






[mas ainda não foi desta vez]

24 de novembro de 2009

Pertences

Uma das coisas que eu mais tenho prazer em fazer é segurar as bolsas dos passageiros no ônibus. Não para que me achem uma alma caridosa, mas para roubar-lhes os pertences. Sou cleptomaníaca, mesmo não achando isso uma mania.

Comecei pequena. Desviando moedas do cofre do meu irmão para comprar coisas. Mas por que roubar para comprar? Vamos roubar o que se quer comprar. Roubei brinquedos dos amiguinhos, aqueles que eu gostaria de ter e poderia comprar. Depois, roubei o que iria comprar. Roubei de lojas, mas não era tão legal quanto de lugares onde as coisas não estavam à venda.

Cresci e encontrei outros meios de ter o que queria. Roubar iguarias das vias públicas, cones de tráfego, tijolos de asfaltos, placas, artigos esportivos de clubes, martelinhos para quebrar o vidro em caso de incêndio. Inutilidades, diria.

Hoje, roubo as bolsas confiadas a mim no ônibus. Não é genial? Praticamente, não é um furto, já que, durante certo tempo de viagem, os pertences a mim pertencem.

23 de novembro de 2009

Sem dia seguinte (Protège moi)

Noite quente. O ventilador fazia vento de chuva só para nos cobrirmos e procurarmos calor um no outro. Fingi dormir só para vê-la dormir primeiro e sentir seu corpo descansar sobre o meu. Para onde Morpheus a leva? E eu, fiquei pensando, pra onde vou quando meus olhos se fecham?

Ouvi um barulho estranho no quarto. Acordei e ela não estava mais ao meu lado. Do mesmo lado que havia dormido. Entrei pela porta do quarto e a vi de quatro dando para outros caras, com outros em volta. Homens que me destroem. “Me fode. Eu te Amo”. Eu não existia mais ali, pra ela. Ali. Ela não me enxergava mais, eu não era mais. Minhas mãos tremiam desejando arder em sua pele, minha boca batia os dentes querendo dizer, meus olhos choravam um ódio velho, minhas forças... Eu não as tinha.

Acordei do pesadelo horrível com o nariz enterrado em seus cabelos negros e cheirosos. Alívio. “Que foi, amor?”. Nada, não foi nada. Ela então se vira pra mim deixando mostrar pela camisetinha folgada o bico do seio direito, o meu favorito - aquele com a pintinha, o que me hipnotiza, aquele que sempre me diz “me chupa” - e começa a me xingar, dizendo que eu não presto, que não valho nada, que eu sou um filho da puta. Eu fico tão abalado que acredito. Quando quem você ama te fere, nada resta exceto ser ferido.

O que eu sinto nas situações é tão desesperador e decadente que eu desejo morrer. Ou acordar. Meu corpo, para me proteger, escolhe a segunda opção. Acordo. Ela deitada em cima do meu braço acorda também. Eu lacrimejava e limpava os olhos e o suor. “Que foi, amor?”. Nada, não foi nada. Um pesadelo. Com nada que valha a pena, preciso ir ao banheiro. Levanto e vou desconfiado até a pia. Me olho no espelho. Será outro sonho? Quem é você? No reflexo só eu mesmo, um eu que eu não vejo. Um eu que só eu vejo. Procuro algo que me acorde. Procuro algo que me mate e só encontro a mim mesmo. Aos meus pés, percebo uma poça d’água e afundo, do quarto ela me chama preocupada “amor?”, sua voz se mistura a tudo e sinto que vou desmaiar. Não respondo. Sento na privada e respiro fundo. Não posso desmaiar. Alguém já desmaiou no sonho? É possível sonhar dentro de outro sonhar. É possível controlar a perda dos sentidos. O que faz sentido quando se perde a realidade? O que faz sentido no que chamamos de real?

Cambaleio até o quarto. A questiono sobre as brigas que não aconteceram. Ela me abraça e disse que tudo foi mentira, um pesadelo. E se agora também for um sonho? Não explico nada, só quero caber em seu abraço. Ela me beija e sinto o conforto de seu carinho amansando o animal assustado. É como me sinto, indefeso e cego em só poder acreditar em todos além de mim. Eu além de mim soa tão melhor.

Fazemos amor, nos juramos amor. Se dessa vez é sonho, não quero acordar. Quero viver sem dia seguinte, um sonho dentro de outro sonho. Um sonho após outro sonho. Paz no caos das minhas ideias. Afundo no colchão grudado nela com medo de cair novamente em minhas armadilhas. Mas ela está lá para me proteger de mim mesmo. Boa noite, amor. Te amo.

20 de novembro de 2009

O Homem Mau Dorme Bem

Numa dessas madrugadas de Lua vermelha fico inquieto, irritado, ansioso, sensível, romântico. Nunca consigo dormir. Nesses momentos, tiro a roupa, ponho uma música, escrevo rascunhos jogados pelo quarto, ótimas ideias para textos que nunca vão acontecer. Ponho a roupa de novo e saio.

Numa dessas madrugadas de Lua vermelha eu saí de andada para tentar te encontrar, como se fosse minha
Risoflora. Os cachorros latiam presos nas grades das casas, construção em cima de construção. Seus corpos ainda sem forças para atravessar paredes, mas não os seus uivos.

O asfalto ondula e desequilibra minhas pernas incansáveis. Só um dejá vù - quando se usa muitas substâncias ilícitas, às vezes o efeito volta mesmo sem ter usado nada, tome nota - As ruas são escuras, mas não guardam segredos àqueles que a pertecem. Uivo libertando o lobo dentro de mim, que por tanto tempo amarrei à rédeas curtas. Os cães me acompanham. A neblina baixa da Natureza me traz a Morte. Deparo com uma cadela caída no asfalto. Seu corpo não parecia machucado ou cansado, ela só não respirava mais. Dois filhotes, provavelmente seus filhos, e ratos, mamavam na mãe morta. Deitei a seu lado e também me banhei de seu leite.
Matei minha sede.

No caminho a Natureza morta crescia em meus passos. Eu achava que tinha o domínio de algo maior que eu. O santo negro e pecador sussurrava doces venenos. Voltei onde meu sangue dormia e ateei fogo em tudo. Deitei em minha cama vazia e deparei com a decadência de uma alma morta.
Tranquilidade na clareira do caos. Vi minha casa em chamas e fiquei pensando que, se eu pudesse salvar alguém, eu salvaria o fogo.

Dormi com os anjos.

Calor

Está tão calor que eu queria derreter
evaporar
e chover
chover





















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Twitter é para os fracos ;)

15 de novembro de 2009

O que eu aprendi no Hospital do Rim e Hipertensão

Primeiras impressões são impactantes e, por isso, muitas vezes ficamos confinados a elas. Mas antes que isso, estas impressões são sempre nosso ponto de partida, seja para uma ação, para uma postura ou um ideal. Neste semestre, tive primeiras impressões relacionadas às milhares de facetas que este estágio possui. Uma relacionada à aparência do hospital, que impressiona muito: organizado, bonito, impecável. Não é por menos que é um dos mais importantes na área – se não o mais. Seguida desta impressão, veio a vista da sala que se tornara minha e de meus colegas por um semestre. Aparte das belíssimas obras dispostas em diversos cantos da empoeirada salinha, víamos uma antítese ao restante do hospital: como se fechada há muito, cheirava e estava suja, além de aparentar completa desorganização dos cativantes materiais. Vi trabalho e um grande potencial.

As semanas se seguiram e as primeiras impressões se mantinham. Eu já pensava que era tempo de desfazê-las (as negativas somente) e concretizá-las nos potenciais imaginados por esta nova equipe, que contava com uma novidade: uma profissional da saúde mental como uma ponte entre nós, ingênuos estagiários, e a instituição. Desta forma, pensamos que provavelmente iríamos conseguir colocar em prática o que aprendemos em toda a faculdade, especialmente nas aulas voltadas à área hospitalar. Pensamos estar mais próximos ao ideal de uma equipe multidisciplinar, que, através da cooperação entre as funções, conseguiria realizar o objetivo de todos estes profissionais: cuidar e promover saúde, nos mais diversos aspectos.

A teoria, porém, diferiu muito da prática. Deparamo-nos com uma grande carga de atravessamentos institucionais, de dificuldades pessoais e com a realidade de um hospital. Ao passearmos com nossos jalecos brancos entre médicos e enfermeiros pelos corredores e elevadores, tornamo-nos verdadeiros fantasmas. Era como se exalássemos inocência e inexperiência, algo percebido por todos e respondido com ignorância ou, quando nos fazíamos presentes com perguntas, com uma rápida réplica “quem é você?”. E ao me apresentar como estagiária de psicologia na Oficina de Artes, não imagino qual destas palavras desencadeava o tom do tratamento ríspido.

Esta é a realidade do hospital, a meu ver, um ambiente muito cruel. Cruel por estas categorizações de acordo com seu papel na instituição, mesmo quando não muito claro - o que te torna um profissional visto como desnecessário. Cruel mesmo quando muito claro, como enfermeiros, abarrotados de funções, responsáveis por coordenar o tratamento dos pacientes e os diálogos entre médicos e técnicos em enfermagem. Cruel também com os médicos, para os quais cabe a difícil tarefa de cuidar de vidas num nível extremamente complexo: ou vida, ou morte. Além de cruel com os usuários do serviço, pois são raros aqueles que vão ao hospital não estando em sofrimento.

Então, por que estávamos lá? Se aos funcionários parecíamos inúteis ou, até mesmo, inconvenientes, nós entendemos que as mazelas físicas não se dissociam das subjetivas, há sempre uma percepção do que se passa. Eis o porquê dos psicólogos: auxiliar na significação que o paciente atribui ao adoecimento. E uma Oficina de Artes parece um bom momento para propiciar este processo, pois recoloca o paciente numa posição ativa, atuando sobre o mundo, e não mais como um ser passivo dos tratamentos médicos. Oferecemos um ambiente diferente, com objetos e cores incomuns ao cotidiano branco, azul-pálido e bege ao qual eles estão acostumados.

Por um breve período de tempo, os pacientes conversam, conosco ou entre si, sobre a vida dentro e fora do hospital. Aqueles das enfermarias coletivas trocam reclamações e piadas mais facilmente que aqueles pacientes dos quartos menores, mais isolados do chamado “agito”. Alguns pedem para serem remanejados e deixar o que parece ser mais um isolamento do mundo. Os pacientes mais quietos demoram mais para se soltar e comumente respondem somente ao que lhes é perguntado. Penso que temem que sejamos mais uns médicos de jalecos, que passam lendo prontuários sem nem trocar um “bom dia” com o indivíduo deitado no leito. Mas aos poucos percebem nossa abordagem diferenciada, nossa atenção e interesse ao que eles têm a dizer. Interesse muito mais voltado à vida que têm e não à doença – disso, eles já estão cansados de ouvir e falar. Conversamos sobre a vida lá fora, os prazeres, as vontades, o que faziam e o que querem fazer. Inevitavelmente, fala-se da doença. Mas é claro! Pacientes crônicos, como estes, têm como parte da identidade ser pacientes renais. Sem nunca deixarem de ser pessoas com diversas possibilidades. Afinal, todos nós temos nossos contratempos na vida.

Com cada paciente, reformulávamos nossas abordagens. Uns queriam conversar mais, reclamar do hospital, reclamar que queriam ir embora, usando o humor para lidar com estes assuntos tão carregados de angústias e ansiedades. Os assuntos mais sérios surgiam em momentos mais íntimos, longe do grupo. Revelava-se a vida antes da doença, o descobrimento, os medos e as superações. Com outros, falávamos com foco alheio à doença, pois era isso que precisavam, ser vistos como muito mais que pacientes. E alguns conversavam como podiam, no silêncio, mas ainda presentes.

Fomos lidando, aos poucos, com as novidades do hospital, os novos aspectos que caracterizam o trabalho nesta instituição, os novos pacientes, os novos desconfortos e as alegrias. Reflito agora como sempre há novidades neste mundo que, na verdade, se repete e se mantém o mesmo. Sempre existirão pacientes com as mesmas queixas, sempre existirão obstáculos institucionais, sempre existirão diferenças profissionais. Mas aprendi que isto não é motivo para não se reinventar, procurar novas saídas e buscar um ideal no qual se acredita. Não se pergunta “para que uma Oficina de Artes?”, mas sim “por que não uma Oficina de Artes?”. Além do mais, ser cego não significa que não se possa mais jogar um jogo da memória.

13 de novembro de 2009

Eu nunca senti [tanto] a sua falta

Naquela mesa
há um espaço que você deixou.
Nas lembranças
as histórias que você não contou.
E eu,

fiquei

esperando.

Se eu soubesse da sua partida,
teria feito o mesmo muito antes
dado parte da minha vida.
Não deu tempo,
não teve jeito.
Ficou assim,
sem solução
soluçando
em meu peito.

Sobrou a sombra do espaço,
ocupando o velório antecipado.
Se a culpa não é nossa,
[como você dizia,]
porque me sinto tão culpado?

Até parece
que o peso
do pesar
pesou
sem avisar.

Veio
assim
assim,
mansinho doído,
que carrego comigo,
antecipando o meu
fim.

O que sobrou
demonstra
a sua indiferença.
Eu nunca senti
Sua presença

O que sobrou
ressalta
eu nunca senti
[tanto]
sua falta.



Feliz Aniversário
.

11 de novembro de 2009

Tons de Cinza

A última luz que vi foi a de seu brilho. Nos despedimos como se não houvesse dia seguinte. Me abraçou e não queria mais soltar, insistiu para que eu a acompanhasse. Eu só disse

"até amanhã".

Quando tudo apagou e os celulares pararam de funcionar, pensei por um breve momento que seria uma invasão alienígena, e aí percebi que realmente acredito nessas coisas. A cegueira momentânea me fazia pensar o valor da luz. Vi pessoas correndo desnorteadas, outros fechavam ruas e roubavam carros. Assaltos, estupros, incêndios. O caos estava formado, eu andava indiferente a tudo aquilo, nada havia mudado.

Quando me deparei com o fogo, naquele momento, só quis voltar
para a escuridão.

O mundo em tons de cinza. Ando por ele e percebo detalhes do que sempre esteve ali e nunca havia enxergado. Ruas, calçadas e paredes dos prédios... Uma coisa só.

Sombra.

O escuro faz a gente querer mais.

O breu silencioso e deserto deveria trazer paz, em outras circunstâncias talvez. Eu conheço todas essas ruas, mas não sabia o caminho de casa. Eu só queria chegar em casa.

Penso nela.

Atravesso a rua em direção a esquina do meu destino e um clarão se forma trazendo à tona meu medo. Me cega de branco e quase não nos vemos, eu por ser sombra, ele por ser luz. Foi por pouco, não queria morrer naquela hora. Não sem me despedir.

Um carro atravessado na frente da minha casa. Alguém conhecido me assusta. Nenhum rosto é conhecido no escuro. E no claro? Uma surpresa desagradável. Oi.

Sem conseguir me achar, sem conseguir dormir. A luz não faz tanta diferença assim. Minha única saída foi uma vela acesa no telhado, meu violão e eu, tocando minhas autorias chatas.

Tentando fugir dos meus sonhos.


Tentando sair da sombra.



Do mundo cinza.





De mim mesmo.





Até amanhã.

10 de novembro de 2009

Acid Food

O que aconteceu depois da tempestade? Estão todos bem? A música aumenta tomando as vozes e gritos do ambiente. A devastação é constante, uma após a outra. O que foi que aconteceu dessa vez?, todos se perguntam sem se ouvir. Estava tudo indo bem... Tenso. Parece que foi uma tensão no sistema.

Ele andava entre os destroços de sua vida. Caminhos de escombros sem saída. Sem ter onde ir, vagou por dias e dias. Sem ter quem encontrar, encontrou a todos. Sem esperanças, não esperou por ninguém. Pensou estar indo embora, mas só caminhava perdido no labirinto. Sem dizer adeus, ele já não estava mais lá.

Um copo de ácido pode ser vulgar, mas é só o que pode alimentar seu espírito. Nada há para se perder. Tampouco há motivos para correr. Faminto, bebeu todo o líquido, e o copo de vidro, mastigou insatisfeito. Não havia mais jeito. Não sentia mais nada batendo em seu peito.

Num canto escuro, chorou escondido suas últimas lágrimas vivas. Sem conseguir encontrar o fim, sem poder viver grandes histórias, sem poder dizer amores... Às vezes é preciso morrer sem que ninguém saiba.

9 de novembro de 2009

Ninguém

Alguém reconhece Ninguém. Mas não conheço alguém. Ninguém não reconhece alguém. Ninguém espera nada. Alguém espera tudo. Não tenho tudo, não sou tudo. Sou algum Ninguém para alguém. Nesse caso, seria Alguém? Nada, continuo sendo Ninguém querendo nada, a não ser de Alguém.

Olhos ofuscados que escondem de Alguém o que Alguém quis saber. nesse caso, sou Alguém. Alguém-Ninguém. Alguém disse nada porque não tinha o que dizer. Em meu silêncio de Ninguém, Alguém me calou. Enquanto outro alguém gritava do outro lado tfgyc4ryh[bati no teclado para não expor Alguém]. o-quei. No que não conta, Alguém disse algo e atravessou o caminho. Ninguém percebeu, mas percebeu sozinho.

Alguém que me ama só diz, só toca Ninguém e troca palavras de carinho. Acha que Ninguém precisa saber. Alguém precisa sempre saber, mas faz mistério que toca as inseguranças de Ninguém. "Mas que tanto exige esse Ninguém? Ele acha o quê, que é alguém?". Aí percebo minha ninguénsidão.

Ninguém odeia e queria ser alguém para ter seu ódio, cansaço e asco do mundo reconhecidos. Mas Ninguém sabe, e sabendo, morre ninguém. Como previsto. Ninguém ama Alguém, ninguém sabe, Alguém sabe. Alguém podia conversar mais, não com ninguém, mas com Ninguém. Ninguém entende nada, e nesse caso, queria ser Nada para ser entendido por Alguém.

2 de novembro de 2009

Dia de Finados

Dia de finados
E eu nem fui te visitar
Eu me perdi nos dias
Nem sei mais
Qual é o meu lugar

Festejei sozinho
Com a mesa posta para dois
Deixa eu morrer só um pouquinho
A vida pode ficar para depois

Tentarei talvez
Numa próxima vez
Conhecer seu novo lar

Mas por enquanto
Vou bebendo outra taça
Em meu acalanto
Enquanto você me abraça
E me enxuga o pranto

Só me resta lamentar
Eu me perdi nos dias
Nem sei mais
Qual é o meu lugar

19 de outubro de 2009

Quanto tempo dura uma caneta?

Meu estômago está tão grande. A angústia das indecisões e a vontade de não fazer nada a não ser ver tv fazem dos meus dias inúteis blocos de tempo passados em casa... comendo. Há dois anos a situação estava completamente invertida. A novidade da sua vinda era tão grande que meu nervosismo por ser vista me impedia de comer. Perdi muitos quilos por sua causa, naquela época. Depois, descobri o prazer de ter alguém para dividir momentos e coisas gostosas. Inclusive comida. Retomei os vários quilos perdidos e ganhei outros novos.

Dividimos muitas coisas mais. Músicas e sons, passeios e momentos inusitados. Inusitado é tudo aquilo que não se espera, mas que de repente aparece. Como você, o estranho adorador de harpas e vozes esganiçadas (espero que não tenha sido por isso que você se apaixonou por mim).

Aprendi muito sobre o inusitado com você, sobre primeiras vezes e novidades. Penso que deveria ter comprado aquela caneta que o vendedor de rua nos ofereceu na primeira vez em que nos vimos. Você ficou todo contrangido por ele ter percebido que você já estava apaixonadinho por mim. Será que a caneta teria durado mais que nós? Acho que não. Nós duramos um bom tempo.

Seremos uma boa lembrança.

***

Enquanto o fim não se concretiza, dou-me a liberdade de explorar minha criação literária.

13 de outubro de 2009

Silêncio Vagaroso

“Fiz minha casa no teu cangote. Não há neste mundo quem me bote pra sair daqui”, tocava ao fundo enquanto repetia a letra como se fosse uma poesia de minha autoria inspirada em você. Ali, à minha frente, sorrindo vagarosamente, combinando com a noite sem pressa.

Meus sentidos eram todos para te sentir. Abraço, beijo, cheiro, toco e ouço tudo que tem a dizer [n]aquela noite. Mas dizemos tudo em silêncio. Lambo teu pescoço e mordo tua orelha, faço graça te lembrando quando disse que queria ser teu brinco só para ficar sempre pendurado em seu lóbulo e ouvir os segredos que te contam – ou os que você mesma se conta.

Sentados na cama, debruçados na janela, olhando o céu, ouvindo Céu, iluminados apenas pela noite e pelo azul da tela do computador. A paisagem são árvores que não conseguimos ver de onde vem, mas podemos enxergar sua grandeza dividindo atenção com as estrelas. Iluminadas por uma luz branca vindo de baixo, elas parecem uma pintura, uma tela a óleo bem delicada. E ficamos imaginando se aquilo não era um quadro gigante que nós estávamos pintando. E uma hora olhei para trás, porque imaginei sermos a pintura de alguém.

Noite quente, a Lua ajudou. O mar de lençóis que cobria a gente ficou jogado, misturado com as roupas pelo quarto. Céu gemia de um lado, nós bem baixinho do outro, só pra gente. Sua pele brilhava de suor, o meu escorria pelo corpo, pingava em teu peito. Beijos molhados, demorados, apaixonados. Sua delicadeza era encantadora. Cúmplices, atravessamos o estar, éramos um único ser. Unos. E vagarosamente, fizemos amor.

Deitados por um tempo, sorrindo de um ou outro pensamento que não precisamos dizer, já sabemos. O vento lá fora fazia das folhas das árvores o barulho do mar, fechei os olhos para imaginar. Você. Sem dizer, só sentindo um ao outro respirar, o corpo indo e voltando o mesmo ar, o mesmo corpo. Eu respirando você, você em mim. “Como pode, no silêncio, tudo se explicar?!”

11 de outubro de 2009

Alienígena Terrestre

Posso dizer que mexo com arte,
mas artista eu não sou.
Posso dizer que escrevo,
mas eu não sou escritor.

Faço um miojo como ninguém,
mas não sei cozinhar.

Canto porque tenho vontade,
não porque sei cantar.


Posso dizer que trabalho,
mas qual é a minha profissão?
Posso dizer que sou bom no que faço,
mas não faço de coração.

Posso dizer que faço experiências,
mas não sou cientista.

Posso dizer
e dizer
e dizer.

Se quiser,
até faço uma lista.

Penso muito na vida,
mas só sei filosofar.
Não gosto de viver,

mas não quer dizer que vou me matar.




Faço as coisas por fazer,
não por amor.

Nunca o amor.

Faço por falta de opção,
não porque dou valor.




O que sou, então?
Senão cada pedaço de alguma coisa e alguém
.
Um pouquinho de tudo,
e ao mesmo tempo, ninguém.


















Um alienígena terrestre, que faz parte
Ao





mesmo

tempo









que
















parte

8 de outubro de 2009

Por dentro

Odeio aquelas pessoas que criam uma intimidade rápida com você e te fazem sentir a melhor amiga que essas pessoas têm.

Mas elas só enganam meu coração de criança, insegura, que nunca teve uma melhor amiga só pra si.

7 de outubro de 2009

Inércia


Prólogo. Pego o ônibus, vou.
Volto.
Pego o carro, vou.
Volto.
Pego o ônibus, um ir, e depois mais um pra voltar.
Espero.
Mais um ônibus, um metrô, quilômetros a pé. Isso tudo antes da chuva. Enquanto eu chovia. Depois volto de tudo para casa. Vinte reais de transporte, dez de álcool, quinze horas de viagem.
Não saí do lugar.




Chuva. Noite de chuva.
"Vai chover".
Combinei às 19h com o Lourenço, vou atrasar, como nunca atraso. Passeio por calçadas desconhecidas, ruelas de paralelepípedos.
Não me importo.
Foi um dia ruim, foi péssimo.
Olho para ele, minha voz quase sai antes da dele.
Baixinho, "oi yuri".

Não dormi nada.
Fiquei pensando, peguei o livro molhado, folheei sem ler nada, pensei mais um pouco. Assisti um filme ridículo de terror, deletei logo em seguida.
Hm, tenho tempo. Tenho tanta coisa pra fazer e tenho tempo.
Faço nada.
Faço pensar.
Queria fazer amor. Olho para minha mão e é o único amor ali.
Faço nada.
Só pensar.

Que dia horrível foi. E qual não é?
Quis me rebater. re-bater. baterbater.
Fiz nada.
Só chorar, por tudo. Um choro que eu nem me lembrava mais que estava aqui, guardado, escondido no escuro, ou no claro. Claro. Qual choro eu não seguro para não me sentir mais seguro? O dos outros, pensei.
Pensei.

Tomei a maior chuva, molhei tudo. Trinta e quatro reais de letras borradas. Estou todo sujo, sujei tudo. Com minha companhia, fui repreendido de palavras.
Corri e corri querendo fugir do que eu nem sei mais.
Chuva.
Começou sendo chuva.

Madrugo esperando o dia, feito o dia esperando a noite acabar.
Ninguém me espera.
O Sol vem chegando com o aviso "it's you now, champs". O Sol também fala inglês, claro, senão vem outro astro mais qualificado e toma o lugar dele.
Pensei.
Vejo o dia nascer, não queria mais nada.
Só ver o dia nascer e mais nada.
Até ele morrer.
Até eu.
Até.



Posfácio. Hoje. A hora que eu levantei o céu estava lindo. Tinha até um motivo para erguer a cabeça. Agora está horrível, depois me perguntam porque só olho para o chão.
Mas não é culpa do céu.
Na moto, frio. Gotas escondem parcialmente o meu destino. Com a viseira ninguém pode me ver. Qualquer coisa é a chuva, choveu dentro. Choveu fora.
Pensar.
Lembrei do que me falaram. "Queria que você falhasse".
Pessoas queridas falam.
Eu fal(h)o.

Eu penso.
Fiquei pensando.
Minha vez. Agora é a minha vez.
Faço nada.
Só pensar.
Minha vez. Agora é a minha vez.
Fui certeiro no poste.
Não aconteceu nada de grave com o corpo.

Espero que estejam felizes.
Pensei.
Meus monstros. Aqueles desenhos que eu não sei desenhar.
Me pergunto a todo instante aonde eu fui parar.
Não saí do lugar.

30 de setembro de 2009

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acabou [sendo nada de_mais].

Mal-me-quer

Voltando para casa numa madrugada fria de meio de semana, me flagrei pensando em quantos mal-me-quer cabem numa flor. Claro, depende da flor e da história de cada amor. Então comecei a lembrar das minhas histórias, de quantos finais foram infelizes e não deram certo. É, porque um final também tem que dar certo, não se pode acabar errado senão nada valeu a pena.

Seguindo essa linha de raciocínio, comecei a pensar nos meus finais. Meus relacionamentos que deram certo com limite de data; minhas semanas, que boas ou ruins acabam fazendo o tão adorado fim de semana; em tudo que eu comecei e não terminei. Isso também é fim(?).


Daí voltei a pensar nas flores, em cada pétala que significava um mal e um bem. A sorte e o azar de ter a flor do destino nas mãos. Alguém me quer(?). Alguém sempre quer alguém, mal ou bem, há o querer. Tudo depende da flor certa.





Le fleurs du mal

frente______verso




















quero ver quem manja.

29 de setembro de 2009

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Silêncio

Andei pensando muito em silêncio esses dias. Andei pensando muito no silêncio esses dias. Pensei parado também. Não tenho objetivo nesse texto a não ser divagar e "pensar alto". Mas sei muito bem como ele vai acabar, pois é, porque tenho lido muito Shakespeare ultimamente. Mas chego lá, e se você tiver paciência para minhas baboseiras, também chega.

O motivo do silêncio como tema é porque tenho ficado mais calado do que o falante costumeiro que sou. Para evitar as costumeiras bobeiras que digo, os constantes desgastes que trago em palavras, as inaceitáveis contradições nos pensamentos transcritos, calo. Calo de pé. Sento.

Mas pensando agora - tudo agora tá gente?! -, qual será o motivo do Silêncio? Às vezes eu acho que ele é um personagem, ou alguém da turma, que eu posso tocar e conversar... Mas não sei seu motivo. Não sempre, pelo menos. Mas nem nosso melhor amigo nem nós mesmos nos compreendemos a toda hora. Tenho exigido demais do silêncio. E de mim.

O Ministério da Saúde [tudo maiúsCULO]adverte: exigir mais de si mesmo dá úlcera e câncer. Se os problemas persistirem, você se fodeu!

Penso no silêncio. Na significância do silêncio. Eu não estou em silêncio agora, estou aqui tagarelando palavras, mesmo que escritas, mesmo que não emita som. Há aqui o não-silêncio.

O dicionário diz que "si.lên.cio sm (lat silentiu) 1 Ausência completa de ruídos; calada. 2 Estado de quem se cala ou se abstém de falar; recusa de falar. 3 Abstenção voluntária de falar, de pronunciar qualquer palavra ou som, de escrever, de manifestar os seus pensamentos". Eu digo mais, ouvi a seguinte pergunta na roda: "E quem vai quebrar o silêncio?". Não existe a quebra do silêncio, existe sua ausência, o Micha(elis) está certo. O silêncio se ausenta porque há o ruído. O silêncio é frágil feito gota de chuva. Há ruídos e palavras. Ninguém quebra o silêncio. Há ruídos e palavras. Som. Son [ofa bít]

Ninguém fala por falar, tampouco cala por calar. Mas não tem melhor silêncio que aquele cheio de cumplicidade que desnecessecita palavras. A simples perfeição muda. A vida não é silêncio, é como diz Macbeth, a vida é uma história contada por um idiota, cheia de som e fúria, que nada significam. Eu não sou silêncio, mas às vezes é preciso calar, para ser (ou parecer) sábio.

“O potente veneno cultiva totalmente o meu espírito. Se tu sempre me segurar em teu coração ficará ausente de felicidade por um tempo. E neste mundo severo, tome fôlego em tua dor, para contar minha história. O resto é silêncio.” Hamlet morre dizendo essas palavras. Quero morrer Hamlet. Quero morrer, Hamlet. [Mas não em silêncio]

Em silêncio, fico pensando, quem vai contar a minha história?

22 de setembro de 2009

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Nem toda insônia é ruim.
Nem tudo escrito às pressas
deve ser lido às pressas.
Pensamento do agora.
Daquela hora.
De toda noite.

21 de setembro de 2009

21.

Se você está lendo isso, não pense que é para você. Não é nem nunca foi. Aqui é meu desabafo, o lugar para rascunhar alguns pensamentos e ter onde guardá-los. Eu não preciso de vocês, mas isso não quer dizer que eu não precise de alguém. Qualquer um que é só a metade podre e insignificante me entende e nunca mais me abandona. Acaba aqui compartilhando dores com discrição e silêncio.

Ontem, tudo em que eu acreditava morreu, mas hoje é meu aniversário e vou espalhar as velas pela casa e atear fogo quando todos estiverem aqui. Assim ninguém nunca mais vai me abandonar. Hoje é meu aniversário e nada aconteceu, eu não sei o que fazer daqui pra frente.

Se ninguém sabe como é a eternidade, eu vou mostrar como ela não é. Desta vez eu não vou hesitar em matar quem for preciso para defender o que eu acredito. Pessoas são frágeis, ideias não. Minha nova frase na parede.

Eu penso em tentar, agora que eu não morri realmente, mas eu preciso de alguém pra me salvar. Me deixar definhar sozinho é pior do que ter coragem pra acabar logo com isso. Então decidam-se.

Não deixá-los ganhar não me satisfaz, ou eu ganho ou vou mostrar como se perde.

Notas Chacotas

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16 de setembro de 2009

Esperança




A solidão é algo desesperador para mim. É ela quem me diz quem eu sou e me faz enfrentar a mim mesmo e só. Eu não sou capaz de me enfrentar, eu sou mais forte do que eu, e o meu eu é mais pesado e mais inteligente do que eu jamais serei.

Eu me sinto como um filme estrangeiro sem legenda, um simbolista surreal sem nexo, sem sentido, que espalha dores e amores por aí sem saber o que está fazendo. Mas ele sabe... Quer dizer, eu sei.

Quando eu me encontrei sozinho, percebi que precisava me mudar como pessoa. Por um lado, eu sou uma pessoa melhor, por outro, me tornei perigoso. De certo modo, eu sinto como se não tivesse nada a perder. Quando eu me tornei ciente disso, percebi que quando se encontra alguém importante de novo, se tem muito mais a perder e me seguro nisso desesperadamente e tento não foder tudo, porque caso contrário, a vida não teria mais valor para viver. E nada vale a pena. E isso é perigoso, isso é foda. E me sinto cada vez mais triste, tentando me segurar e escorar em pessoas, lugares e idéias... Mas sem sucesso.

Essa é a resposta quando me perguntam por que não consigo ficar sozinho. Eu adoro ter meu espaço, ser sozinho, mas solidão é foda. E me sinto cada vez mais triste e medroso, porque sinto o perigo disso a cada respirar. Uma hora para, e tudo acaba.

O que me conforta é saber que no Inferno encontrarei um monte igual a mim. E essa é a minha esperança para o fim da solidão.